Prof.A.Marins |
Um dos principais conceitos do Sistema Lean é o "Genchi Genbutsu", nos conta José Roberto
Ferro, Presidente do Lean Institute
Brasil . Significa em japonês o local real ("Genchi") e a coisa real ("Genbutsu"). Implica que as pessoas devem ir até onde tudo
ocorre, para serem capazes de analisar e entender profundamente o que está
acontecendo na empresa. É uma maneira de se envolver pessoalmente e diretamente
com processos e problemas reais. É um conceito ligado à famosa frase "dados
são importantes, mas dou maior ênfase aos fatos", de Taiichi Ohno
(1912-1990), executivo da Toyota, o principal arquiteto do Sistema da montadora.
Quer dizer que, para saber das coisas, você precisa ver por si próprio, com
olhos críticos.
Trata-se de um sistema diferente do modelo tradicional de gestão baseado exclusivamente em indicadores, números ou dados - que são sempre meras
representações do que acontece na realidade.
Taiicho Ohno |
Infelizmente, esse modelo tradicional, baseado na definição e
comunicação de "indicadores e metas", parece suficiente para a maior
parte das empresas. A alta administração estabelece as metas. E "como
chegar lá" tende a ser visto como responsabilidade dos outros níveis da
organização. Pior, muitas vezes ouve-se a seguinte frase "não me importa o
que você faça, desde que os resultados sejam atingidos".
Totalmente inverso disso, o "Genchi Genbutsu" (que pode ser
traduzido como "vá ver") tem um impacto muito mais profundo sobre a
empresa ao sair da gestão baseada em números para outra fundamentada em
processos reais - os meios para se chegar aos resultados.
Isso não quer dizer que você deva sempre desconsiderar as conclusões de
alguém ou relatórios enviados por colaboradores. Em absoluto. Significa, sim,
que entender a situação é sempre mais fácil quando você verifica tudo pessoalmente.
José Roberto Ferro |
Em resumo, o "Genchi Genbutsu" é muito mais do que uma
atividade adicional nas empresas. É mais que uma simples questão de caminhar e
conversar. É parte essencial do Sistema Lean. O grande problema é que quando
sugerimos aos líderes das empresas que façam o "Genchi Genbutsu"
encontramos pelo menos três tipos de reações.
Uma é a do "líder arrogante", que se considera o
"chefe", o "imperador". Que não se preocupa, pois afirma se
assessorar de boas pessoas e dispor de uma boa gestão de indicadores, rápida e
precisa. E por isso não vê necessidade de ir ao "Gemba" (chão de fábrica,
no dicionário Toyota) e nem de estimular colaboradores a fazerem o mesmo.
Outro é o líder que reconhece que está distante. Percebe o valor do
"ir ao gemba". Promete fazer um esforço para sair da sala de reunião.
E até o faz, mas fica meio perdido, sem saber exatamente o que observar ou o
que fazer.
E há ainda os que dizem já fazer isso cotidianamente. Mas não percebem
que sempre vão ao "Gemba" com comportamentos inapropriados. Atuam
como um "elefante numa loja de porcelanas", intimidando e ameaçando
punir. E assim quebram a cadeia de ajuda e geram "mura"
(irregularidade) e "muri" (sobrecarga), acabando com padrões e estabilidade.
Ou seja, apagam incêndio com gasolina.
Esses tipos de líderes não percebem que metas e objetivos cascateados de
cima para baixo, sem uma visão clara do como vão ser conquistados, podem ser
perigosos por basicamente dois motivos.
Primeiro porque esse estilo de gestão "cega" líderes que, ao
desconhecer os processos reais, não ajudam subordinados, mas apenas usam a
autoridade do cargo para garantir obediência, não estabelecendo assim um
diálogo construtivo.
Segundo, porque quando simplesmente entramos no "modo
automático" de implementar ações definidas num plano para atingir metas,
não reconhecemos o fato real de que estamos adentrando num espaço de incertezas
em que as condições vão mudar e não sabemos exatamente o que vai acontecer. E as
coisas nunca acontecem exatamente como o previsto. E ajustes sempre são
necessários.
Já no Sistema Lean, não interessa atingir somente os resultados.
Interessa o processo pelo qual o resultado será atingido. E o líder Lean não
deve "dar" a solução, pois isso tiraria a responsabilidade dos
responsáveis pelo processo, mas também não deve deixar que eles resolvam como
quiserem.
Junto com os responsáveis, o líder Lean deve ir ao Gemba para fazer perguntas e entender o que está ocorrendo. Depois,
garantir que seja estabelecido um processo científico que represente uma boa
proposta de como atingir os objetivos. Por exemplo, um PDCA, sigla de Plan
(planeje), Do (faça), Check (cheque) e Act (aja), método científico de se
propor uma mudança em um processo, implementar essa mudança, analisar os resultados
e tomar as providências cabíveis.
E se a solução não for alcançada pela proposta, cabe ao líder fazer com
que esse processo gere um aprendizado, para que se consiga ver o que deu certo
e o que deu errado.
Processos cientificamente melhorados são tão importantes quanto os
resultados alcançados por eles. Porque geram resultados sustentáveis.
Resultados alcançados aleatoriamente nunca são sustentáveis. E gerar
aprendizado enquanto se melhora processo e se atinge resultado é, na verdade, o
objetivo mais importante.
É por isso que "Genchi
Gembustsu" significa uma mudança fundamental no sistema de gestão da
empresa. Com ele, o foco central, em todos os níveis de gestores, passa a ser
na padronização, na estabilização e nas melhorias das rotinas, práticas e
processos organizacionais. E não nas metas, indicadores e objetivos
quantitativos.
Afinal, de onde vêm os resultados senão dos fluxos reais de agregação de
valor e da redução e eliminação de desperdícios e custos? É a diferença, por
exemplo, entre administrar estoques olhando para uma tela de computador ou
olhando diretamente para as prateleiras num sistema simples de gestão visual. É
fácil perceber qual o método mais preciso ou qual permite uma resposta mais rápida.
Essa preocupação é crítica para a obtenção de resultados financeiros notáveis.
E para a sobrevivência da empresa no longo prazo.
Pense nisto e tenha uma ótima semana!
Fonte: José Roberto Ferro - Presidente do Lean Institute Brasil (www.lean.org.br),
entidade sem fins lucrativos criada para disseminar no Brasil o Sistema Lean
inspirado no Modelo Toyota; é "Senior Advisor" do Lean Enterprise
Institute, dos EUA, e membro do Board da Lean Global Network (LGN). É autor de
capítulos da versão em Português dos livros "A Máquina que Mudou o
Mundo" e "Mentalidade Enxuta nas Empresas", de Jim Womack e
Daniel Jones.
Nota: Taiichi Ohno é considerado o criador do Sistema Toyota
de Produção e o pai do Sistema Kanban. .
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